A Ghost Story: quanto tempo o tempo tem?
Por Marcelo RamosFonte: Ponto Crítico
A Ghost Story é um filme do diretor David Lowery, lançado em 2017, e estrelado por Rooney Mara e Casey Affleck. O filme com certeza passou despercebido pela grande maioria do público, mas recebeu diversas críticas positivos, além de levar diversos prêmios para casa. Apesar disso, não é um filme fácil. E apesar disso, é um dos melhores filmes que já vi.
É difícil encontrar palavras que descrevam o que esse filme é, o que ele tenta passar. Não é um filme de terror, mas assusta mais que a maioria. Não é um ensaio sobre o luto, mas em certos momentos dá-se a entender isso. Tem elementos de drama, mas não é seu foco. Não consigo enquadrá-lo em uma categoria que satisfaça tudo aquilo que ele é, pois é um filme diferente de tudo que eu já vi.
É um ensaio sobre o tempo. Sobre sua passagem, sobre o fim, o começo, o começo e o fim, e o fim, e o começo... É sobre a vida, e ciclos, e a passagem das eras, e o depois.
O depois. Aquela bela palavra que nos salva do inevitável. Mas e depois? Quanto tempo dura a eternidade? No filme, acompanhamos a personagem vivida por Casey Affleck, que morreu em um acidente e se tornou um fantasma. Junto a ele, a personagem de Rooney Mara, sua esposa, protagonizam boa parte do filme, mas temos um terceiro protagonista: o tempo. O fantasma volta para casa, e acompanha sua esposa em um estágio de luto contido, sombrio, solitário, e vemos o tempo passar para ambos. E o tempo traz mudanças, traz um fim. Mas a eternidade não é algo finito, e C (o personagem de Affleck) precisa enfrentá-la.
O filme é marcado por planos e cortes longos, cenas em que parece que nada está acontecendo, em que não há diálogos expressivos, nem nada muito surpreendente. Por exemplo, a cena da torta, em que a personagem de Mara come após o enterro do marido e demora mais ou menos um cinco minutos. É apenas ela, comendo a torta, com o fantasma do marido observando. Mas é muito mais que isso. Tais planos nos mostram que o tempo está passando. E nesse tempo, os personagens estão sofrendo, sendo felizes, superando perdas e mudando. No exemplo anterior, vemos que a personagem está mal pela perda, de uma forma tão grande que não se importa mais com si mesma, com sua própria saúde.
Em uma das sequências mais geniais do filme, vemos a personagem de Rooney saindo de casa diversas vezes, sob a ótica de C, representando o passar dos dias. E com o passar dos dias, sua dor vai diminuindo e diminuindo, e tudo isso é passado sem palavra alguma. Aliás, o filme em si usa mais imagens e gestos para mostrar algo, que palavras. Exceto em um monólogo que acontece mais ou menos depois da metade do filme. O dono do monólogo é um personagem que nunca vimos, e que não vai mais aparecer. Usando conceitos filosóficos, ele nos conta sobre o universo, o tempo, a vida, a morte, ciclos, fé e humanidade. Mas longe de ser expositivo, o monólogo nos deixa com mais dúvidas, questões e um sentimento angustiante de finitude.
É um dos melhores filmes que eu vi na vida, e vou guardá-lo por anos e anos, não por seus quesitos técnicos, mas muito além: pelo que ele me fez sentir. Pelo que ele me fez ser.
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